Eixo intestino-pele: conexão científica entre saúde e beleza

Nem só de cremes, máscaras e loções se faz uma pele saudável! Ela começa a ser construída de dentro para fora e o intestino é uma peça importante nesse processo.

A ciência já mostrou que existe uma conexão complexa e fascinante entre equilíbrio intestinal e qualidade da pele. Conhecida como “eixo intestino-pele”, ela começa a ganhar mais destaque unindo as ciências da nutrição e da medicina dermatológica, e mostrando novos caminhos para a prevenção e o tratamento de questões cutâneas.

Neste artigo, vamos falar sobre como essa conexão se estabelece e de que forma ela afeta a saúde da pele, além de explorar estratégias baseadas em evidências para manter intestino e cútis em sua melhor forma.  

Leia até o final e veja como potencializar sua rotina de cuidados com a pele começando pelo intestino.

O que você vai ler neste arquivo:

  • Como funciona o eixo intestino-pele?
  • Intestino e saúde da pele: o papel dos ácidos graxos de cadeia curta
  • Problemas de pele relacionados à disbiose intestinal
  • Impacto do Intestino na pele: compreendendo padrões 
  • Alimentação e suplementação: estratégias benéficas para o eixo intestino-pele
  • Probióticos e prebióticos: como eles atuam?
  • Dicas práticas para nutrir um intestino equilibrado e uma pele saudável
  • Conclusão

Como funciona o eixo intestino-pele?

Nosso intestino hospeda uma variedade de comunidades microbianas que desempenham um importante papel na saúde geral, incluindo o eixo intestino-pele. A comunicação entre os dois órgãos acontece por meio de múltiplas vias.

Um dos mecanismos centrais envolve a integridade da barreira intestinal. Quando há disbiose, ou seja, um desequilíbrio entre as bactérias benéficas e as bactérias prejudiciais do intestino, acontece o que chamamos de hiperpermeabilidade intestinal ou leaky gut (intestino permeável). 

Quando a barreira intestinal deixa de “filtrar” corretamente determinadas substâncias, toxinas e partículas alimentares mal digeridas podem chegar à corrente sanguínea, provocando efeitos negativos na pele, como inflamação cutânea, prurido (coceira) e déficits na barreira epidérmica. 

Isso ajuda a explicar por que muitas pessoas observam melhoras na qualidade da pele quando adotam estratégias nutricionais para restaurar a saúde intestinal, incluindo o uso de probióticos, prebióticos e nutrientes que apoiam o fortalecimento dessa barreira intestinal natural. 

Intestino e saúde da pele: o papel dos ácidos graxos de cadeia curta

Um dos mecanismos mais importantes do cuidado intestinal, que pode se refletir em benefícios para a pele, envolve os ácidos graxos de cadeia curta, especificamente acetato, propionato e butirato. Eles são produzidos pela fermentação de fibras dietéticas e pelo consumo de fitoquímicos presentes em alimentos como gengibre, cúrcuma e jabuticaba. 

Em estado de eubiose (equilíbrio microbiano) intestinal, esses metabólitos atuam de modo favorável nos linfócitos T reguladores, inibem vias pró-inflamatórias e reforçam as chamadas tight junctions, ou junções apertadas, do intestino. 

O resultado dessa ação é uma redução na inflamação e uma melhor função da barreira cutânea. 

Por isso, quando temos uma alimentação pobre em frutas, vegetais e especiarias, e abundante em alimentos ultraprocessados, a produção de ácidos graxos de cadeia curta diminui e ficamos mais suscetíveis a dermatoses inflamatórias, ou seja, temos maior risco de desenvolver doenças de pele caracterizadas por inflamação.

Problemas de pele relacionados à disbiose intestinal

A disbiose intestinal se caracteriza pela perda de diversidade na microbiota (conjunto de bactérias que habitam o intestino) e/ou alterações no microbioma (que engloba a microbiota, seu ambiente e funções).

Pesquisas científicas permitiram comprovar que essa condição pode desencadear diversos problemas de pele, como acne, dermatite atópica, psoríase e rosácea.

Vamos detalhar um pouco mais essa relação:

Dermatite atópica

A relação entre o desequilíbrio da microbiota intestinal e a dermatite atópica é bem documentada na literatura científica, mas o que justifica essa associação exatamente? 

Sabe-se que as bactérias intestinais patogênicas (bactérias prejudiciais) causam uma ruptura das junções intestinais, o que favorece a passagem de proteínas mal digeridas para a circulação sanguínea. Essas proteínas podem desencadear uma resposta alérgica com a liberação de histamina, levando a reações de pele, como a dermatite. 

A pele com dermatite apresenta descamação, vermelhidão e coceira, ou seja, uma condição que provoca desconforto físico e também prejuízos à aparência.

O consumo de probióticos tem mostrado um efeito preventivo valioso na dermatite atópica, tanto em crianças quanto em adultos. Isso deixa claro que equilibrar o microbioma intestinal é uma ação eficiente de cuidados com a pele em qualquer idade. 

Psoríase 

A psoríase é uma doença de pele crônica, autoimune e não contagiosa, que acontece quando o sistema imunológico acelera o ciclo de crescimento das células da pele, fazendo com que haja um acúmulo na superfície desse órgão. 

Suas causas ainda não são completamente conhecidas pela ciência, mas sabe-se que existe uma predisposição genética e a ativação pode acontecer por fatores externos como estresse, infecções ou uso de determinados medicamentos.  A pele com psoríase, apresenta manchas vermelhas, aspecto de escamas esbranquiçadas, coceira, queimação, dor e alto ressecamento que pode provocar rachaduras e sangramentos.

Revisões científicas descrevem um crosstalk intestino-pele com desvio imunitário e alterações no microbioma que podem modular tanto a atividade cutânea quanto articular. 

Estudos apontam que a suplementação com probióticos e vitamina D pode fortalecer ambas as barreiras, do intestino e da pele, e reduzir a produção de interleucina 17 (um tipo de citocina), associada à produção excessiva de queratina, que leva ao espessamento da pele, tornando-a mais rígida e seca. 

Rosácea 

Essa também é uma condição de pele crônica e inflamatória que afeta principalmente a região central do rosto. Ela é marcada por vermelhidão, vasos aparentes e lesões semelhantes à acne. Costuma atingir especialmente pessoas entre 30 e 50 anos e é mais comum em indivíduos de pele clara. Além de uma alteração estética na pele, pode causar desconfortos como ardência e coceira.

Na rosácea, estudos observacionais associam disfunções gastrointestinais, incluindo supercrescimento bacteriano no intestino delgado (SIBO), a maior risco e gravidade da condição. Isso sugere que a correção da disbiose pode atenuar manifestações de pele em grupos específicos. 

Hidradenite supurativa 

A hidradenite supurativa é uma doença de pele que provoca caroços dolorosos e inflamados em regiões onde há dobras, como axilas e virilha. Esses caroços podem se transformar em feridas e, com o tempo, formar cicatrizes. 

Essa condição é gerada por bloqueio e inflamação das glândulas de suor e se manifesta em surtos que vão e vêm ao longo da vida. Dados científicos recentes apontam para uma correlação entre a composição do microbioma intestinal, desregulação imune e progressão da doença. Isso reforça o papel sistêmico do intestino nas dermatites inflamatórias.

Impacto do intestino na pele: compreendendo padrões

Como vimos, embora haja variação na força das evidências relacionadas às diferenças doenças de pele, é possível observar um padrão em todas as condições dermatológicas: a disbiose intestinal leva a uma menor produção de ácidos graxos de cadeia curta, a falhas na barreira intestinal, endotoxemia (presença de toxinas na corrente sanguínea) e inflamação crônica de baixo grau, além da disfunção no sistema imune. 

Esse conhecimento permite abordagens terapêuticas inovadoras na área dermatológica, tratando e prevenindo condições de pele por meio da restauração da saúde intestinal.

Alimentação e suplementação: estratégias benéficas para o eixo intestino-pele.

Para manter um intestino saudável, com uma microbiota equilibrada e diversa, estratégias nutricionais podem ser adotadas. Entre elas, alimentação rica em fibras e polifenóis; consumo de probióticos e prebióticos; e suplementação de nutrientes específicos, como glutamina, zinco e colágeno.

Saiba mais sobre alguns desses grandes aliados do intestino e da pele.

Fibras fermentáveis: evidências demonstram que uma dieta rica em fibras fermentáveis alivia a sensibilização sistêmica a alérgenos e reduz a gravidade de doenças cutâneas. Elas podem ser encontradas em alimentos como: aveia e outros cereais integrais; leguminosas; vegetais crucíferos (brócolis, couve-flor, repolho); raízes e tubérculos.

Gengibre: é rico em gingeróis e shogaóis, compostos com potentes propriedades anti-inflamatórias que podem modular a resposta imunológica e reduzir a inflamação sistêmica que afeta a pele.

Cúrcuma: a curcumina, principal composto ativo da cúrcuma, demonstra efeitos anti-inflamatórios significativos e pode ajudar na modulação da microbiota intestinal, favorecendo o crescimento de bactérias benéficas.

Jabuticaba: rica em antocianinas e outros polifenóis, a jabuticaba fornece compostos antioxidantes que podem ser fermentados pela microbiota intestinal, contribuindo para a produção de metabólitos benéficos.

Glutamina: um aminoácido fundamental para a manutenção da integridade da barreira intestinal, a glutamina serve como combustível preferencial para os enterócitos (células do intestino) e é essencial para a manutenção das junções apertadas (tight junctions) que previnem a hiperpermeabilidade intestinal.

Zinco: é um mineral vital para a síntese de proteínas e reparação tecidual, mas desempenha também um papel crucial na manutenção da integridade das barreiras intestinal e cutânea. Deficiências de zinco estão associadas a problemas de cicatrização e maior vulnerabilidade a infecções cutâneas.

Colágeno: além de seus benefícios diretos para a pele, o colágeno fornece aminoácidos específicos (glicina, prolina, hidroxiprolina) que são importantes para a reparação e manutenção da barreira intestinal.

Probióticos e prebióticos: como eles atuam?

Nas estratégias nutricionais voltadas à saúde intestinal os probióticos e prebióticos têm papel de destaque, graças ao seu impacto direto na regulação da microbiota intestinal. 

Os probióticos são micro-organismos vivos que, administrados em quantidades adequadas, trazem benefícios à saúde do hospedeiro. No contexto da saúde intestino-pele, podemos destacar: regulação da resposta imunológica, redução do estresse oxidativo, fortalecimento da barreira intestinal e melhora na produção de ácidos graxos de cadeia curta. 

Os prebióticos, são compostos não digeríveis que estimulam o crescimento de bactérias benéficas no intestino, importante para prevenir ou corrigir a disbiose. 

Dicas práticas para nutrir um intestino equilibrado e uma pele saudável

Tenha a alimentação como base

Uma alimentação rica e diversificada é o primeiro passo para um intestino equilibrado. Consuma diariamente alimentos ricos em fibras fermentáveis, incluindo vegetais diversos, frutas com casca, leguminosas e cereais integrais. 

Incorpore ao preparo das suas receitas alimentos que tenham compostos anti-inflamatórios, como gengibre e cúrcuma. 

Aposte em uma suplementação estratégica

Considere a suplementação com probióticos de alta qualidade e prebióticos para nutrir as bactérias benéficas do seu intestino. Além disso, pode ser útil suplementar nutrientes como glutamina, zinco e colágeno, que têm papel positivo na barreira intestinal. 

Hábitos e estilo de vida

Procure manter horários regulares de alimentação, hidratação adequada e um sono de qualidade, além de controlar os níveis de estresse. Todos esses fatores impactam tanto a saúde intestinal quanto a saúde cutânea. 

Orientação individualizada

A resposta de cada pessoa aos mesmos estímulos pode ser muito variada. É sempre aconselhável buscar a orientação individualizada de profissionais habilitados para desenvolver estratégias de alimentação e suplementação: nutricionistas ou médicos.

Conclusão 

A evolução das pesquisas científicas tem nos ajudado a compreender cada vez melhor as complexas interações entre o intestino e a pele e, a partir desse entendimento, conectar as áreas da nutrição e da dermatologia de forma eficiente. 

Por ser nosso órgão mais exterior, a pele pode ser percebida muitas vezes como algo desconectado do que acontece “dentro” do nosso organismo, mas isso está longe de ser verdadeiro. Ela faz parte de um sistema integrado que inclui o microbioma intestinal, o sistema imunológico e diversas vias metabólicas. 

A abordagem nutricional que busca promover a saúde intestinal não deve ser encarada como o tratamento central das doenças de pele, mas sem dúvida é uma aliada de grande valor. 

E quando falamos em prevenir desequilíbrios que podem impactar a saúde da pele (e a saúde como um todo), uma boa nutrição é inegociável. 

Se você quer melhorar a saúde e a aparência da sua pele, lembre-se de cuidar também do seu intestino! Vale a pena investir em uma nutrição favorável ao seu microbioma, da mesma forma que você investe em sua rotina de cuidados cosméticos. 

A ciência demonstra que essa visão integrada pode fazer toda a diferença na qualidade da pele e no bem-estar geral.

Gostou do artigo? Encaminhe para aquela amiga que é louca por skincare e precisa saber disso. 

Referências bibliográficas

DOI: 10.1080/19490976.2022.2096995

DOI: 10.3390/microorganisms9020353

DOI: 10.1016/j.clindermatol.2021.08.021 

DOI: 10.1080/19490976.2025.2473524

DOI: https://doi.org/10.1038/s41385-022-00524-9

DOI: 10.3390/nu15143123